PARTE 6 – O Desconhecido – A Fada, o Corvo, e o Baleeiro


Um Sawsbuck de pelagem de Inverno passou a sua frente numa correria. Era tão veloz cortando a estrada que a Tinkatuff mal deu por ele em sua frente, quase sendo atropelada. Estranhou o comportamento súbito do Pokémon, mas não fez muito caso. Avançou no meio do trilho de terra batida. Até agora, a viagem corria calma, tranquila, sem nada de suspeito.


Procurou o Pokémon com olhar, encontrando-o, com as orelhas fitadas e o olhar atencioso, uns metros abaixo, ainda a galope, mas já a reduzir velocidade até parar. O peito dele subia e descia descompassadamente.


É… Talvez, o melhor era mesmo perguntar se tinha ocorrido alguma coisa.


– Ei, amigo, para quê tanta pressa? – Projetou sua voz até ele, metros abaixo. – Para a próxima tem mais cuidado! Quase me ias botando ao chão.


– XIUU. Menos barulho! – Ele rebateu, depois de procurar a direção de onde vinha a voz. – Corre! Eles estão perto!


Eles?...


– Mas, quem são eles? – A fada questionou, perplexa com toda a pressa e sua pressão.


– Não sabes? – O veado pareceu incrédulo, como se não acreditasse na ignorância da outra. – Caçadores! Vários Pokémon de Glaseado já desapareceram por culpa deles!


– Caçadores?... – Ela ficou confusa. Sentia sede por mais informações Seria algum Pokémon predador novo? – Não consegues explicar melhor?


– Sem tempo, não dá! FOGE! Foge se dás valor à tua vida!


E quando disse ‘’Foge se dás valor à tua vida!'‘ já ele ia muito distante, tanto que sua súplica era um ofegante grito que ecoou na encosta à medida que seus cascos pulavam de lugar em lugar.


Sentiu um vento gélido ainda mais frio que o usual incidir-lhe nas costas. O que quer que fosse que tivesse a perseguir aquele coitado, era, talvez, quem ela procurava. Sem o rei da montanha a controlar tudo, apesar dos defeitos, óbvio que muita coisa iria passar despercebida entre as comunidades dispersas. Nada melhor que atacar quando todos menos esperam. A Tinkatuff acelerou o passo, sem saber se devia correr para se proteger ou dar meia volta e cortar o mal pela raiz. O que quer que fosse, já estava a caminhar na mesma estrada que ela percorria.


Foi ai que avistou uma rocha grande, na beira da estrada.


Era o esconderijo perfeito.


Foi até lá, e aguardou.


Silêncio.


Vento.


O bater descompassado do seu coração.


O peso da sua arma em riste.


Mais vento.


Silêncio.


Dez minutos se passaram.


Algo cortou o silêncio.


Um som súbito, sibilante. Tão súbito que a Tinkatuff não soube distinguir se era real ou produto da sua imaginação.


Aguardou. Esperava por mais. Precisava de uma confirmação, do que quer que aquilo fosse.


Mais silêncio.


Mais dez minutos.


O barulho ecoou outra vez na encosta.


Desta feita, ainda mais perto.


Muito perto.


Queria aguardar. Queria correr. Era um som semelhante ao embate na sua pá nas rochas. Mas ainda mais aterrador que as explosões que as rochas proferiam com seus golpes.


Sentiu o som de cascos a passar numa galopada frenética.


O mesmo Sawsbuck desesperado dera meia volta e estava, outra vez, no meio do trilho.




Outro barulho.


O som de algo a cair, um baque abafado no solo.


A Tinkatuff espreitou por cima da rocha.


O Sawsbuck encontrava-se a alguns metros dali, esperneado no chão de pedra e cascalho. Ele mal conseguia gritar, engasgado num líquido vermelho que só podia ser o próprio sangue. Seus olhinhos negros estavam tão esbugalhados e brilhantes que quase lhe saíam da órbita.


Deixando as traseiras de uma moita, após o farfalhar de seus galhos, mesmo ali ao lado, surgiram três figuras disformes. Ouviu vozes. Do outro lado, mais umas duas ou três daquelas criaturas bizarras sem pelo e de roupas coloridas, apareceram vindas de sabe-se lá de onde. Os bichos bípedes traziam umas ferramentas bizarras em mãos. Um deles foi com a mão ao bolso, e, apesar do terror, a fada conseguiu distinguir em seus dedos um dos tais chumbos que ela encontrara, tanto na placa de madeira como na armadura do Corviknight.


Foram eles.


O humano recarregou a espingarda.


Apontou a arma na cabeça do jovem Sawsbuck.


Pressionou o gatilho.


O som abafado de antes, mais alto que nunca, ecoou pelo céu.


Em poucos minutos, o veado imobilizou-se. Deixou de espernear.


Estava morto.


A fada evitou gritar, mas um berro incontrolável de espanto e terror foi gravado em seus lábios, agora encobertos pelas suas mãos trémulas que abafavam o som, em vão. Pressionou a cara.


Não vou gritar mais. Não vou gritar mais. Sou mais forte que isto para gritar.


O que é que ela acabara de assistir?... Só esperava que o que quer que aquelas criaturas eram, não a tivessem pressentido ali.


O Sawsbuck de antes, a correr, cheio de energia, ainda era uma visão demasiado recente para ela. Ela não queria acreditar que era o mesmo Sawsbuck que agora estava ali, estirado no chão.


Morto.


Olhou para o ponto mais alto de Glaseado. A montanha estendia-se quilómetros e mais quilómetros ali ao lado, arranhando o céu. Estava longe do vale mas… Pensou nos Cetitans e todos os Pokémon que lá conhecera. Desejou que eles tivessem seguros ali naquele cantinho especial, com o seu rio serpenteando as águas límpidas diariamente. Não suportava a ideia de ver Wohali sofrendo o mesmo tipo de brutalidade que acabara de viver.


Tinha que proteger sua família. Tinha que proteger seu velho lar.


Estava perdida nos pensamentos, em choque.


Foi quando sentiu alguém puxar-lhe a pá.


Caiu uns metros em frente, com o empurrão súbito que levou.


Fora descoberta.


Mas estava com demasiado medo daquele desconhecido atrás de si e de tudo o que ocorreu para se mexer e se proteger nos segundos que se seguiram. Ainda demorou muito tempo, mais do que conseguiu imaginar, a reagir.


Aquilo era completamente fora do seu alcance.


Pessoal. Olhem! Aqui! O que eu encontrei! – Aquela coisa gritou aos outros, mostrando seus dentes amarelos e retorcidos.


Outro daqueles seres aproximou-se.


A menininha tá perdida? – Ele gargalhou, pontapeando-lhe o braço.


O canudo da espingarda estava prestes a soltar outro dispare. A fada sentiu o canudo frio penetrar-lhe o cabelo.


O que tu tá fazendo, mano? – Um deles repreendeu-o. A Tinkatuff teve o leve vislumbre de ver o humano baixar a arma. – Ela é minha. Depois vou ver o que fazer com ela.


Para que queres esse Pokémon?


Ela parece forte. Bem forte.


Ela é gordinha. É bem mais proveitoso se ela fosse a derreter como os outros.


Ela estancou… Derreter como os outros?... Como assim, derreter? Não entendia muito bem a voz dos humanos, mas por algum motivo, graças a alguma força misteriosa, algum chamado do destino, conseguiu distinguir aquela frase, bem nítida, em sua cabeça.


Despertou para a realidade.


Tinha que lutar. Que fugir. Tal como o veado a instruíra.


Foge se dás valor à tua vida! – A voz do pobre coitado ecoou em sua mente.


Deu um pulo súbito.


Ela não queria limitar-se a fugir. Ela queria lutar em nome de quem amava. Queria acabar com aquela praga e salvar sua família. Libertar seu lar de tamanho mal. Soltar a montanha do novo horror que a encobria.


Fez a sua pá girar, derrubando no chão os humanos desprezíveis que a rodeavam. Ouviu a espingarda disparar, quando quem a portava caiu ao chão, mas não notou para onde o tiro fora. Fez a pá deslizar outra vez, cravando-a num dos crânios do inimigo. Ouviu-se outro disparo. Uma dor percorreu-lhe o cotovelo. Uma dor imensa. Largou a sua pá, para analisar seu próprio braço. Sangue escorria. Ela nunca imaginou que ficaria tão tonta por ver a sua própria ferida escorrendo de tamanha maneira.


Depois, sentiu outra pancada. Outro disparo.


Tudo, foi tudo muito rápido.


Tudo se apagou, antes de ter a sensação de que estava a ser sugada por um raio para o interior de qualquer coisa húmida e quente.


Capítulo Adicional Continua Na
PARTE 7


Ilustrações dos Capítulos Adicionais #03 - A Fada, o Corvo, e o Baleeiro PARTE 3 e PARTE 4 e PARTE 5



Os desenhos podem não estar na ordem pela qual eles surgem no capitulo. Tenha atenção a possíveis Spoilers que podem comprometer sua experiencia!

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Desenhos da Parte 3 de A Fada, o Corvo, e o Baleeiro





Desenhos da Parte 4 de A Fada, o Corvo, e o Baleeiro




Desenhos da Parte 5 de A Fada, o Corvo, e o Baleeiro
 

PARTE 5 – A Vingança – A Fada, o Corvo, e o Baleeiro


Dias passaram, até se tornarem semanas, e depois alguns meses, para não dizer anos.


O Corvo havia desaparecido.


Para alívio de muitos. Para terror de outros.


A montanha estava livre. Essa era a verdade inegável. Ninguém controlava ninguém, muito menos seguiam regras idiotas.


Ninguém ousou procurar pelo mesmo. Ninguém subiu até o topo da montanha para confirmar, ou, no mínimo, encontrar pistas sobre o paradeiro da enorme ave negra outrora lá bem empoleirada. E quem o faria, nunca se aproximava o suficiente do trono do Corvikinght, preferindo apreciar o mesmo à distância.

 E com isso, a paz dominou Glaseado.


Com a paz, veio a abundância, e com a abundância, a sensação de conforto e tranquilidade era cada vez maior. Em breve, todos esqueceriam os tempos negros ali outrora vividos, como se os mesmos já não importassem mais.


Muitos dos Cetoddle de outrora eram agora Cetitans iniciando as vidas adultas com suas próprias famílias e crias. A nova alimentação devido à abundância que dominava os ares contribuiu muito para a evolução individual de todos. Entretanto, a jovem Tinkatuff cresceu mais e agora era uma revigorante donzela, apesar dos treinos terem abrandado em frequência, se limitando a apenas uma ou duas vezes por semana.


Entre todos os habitantes do local, ela parecia ser a única que se lembrava do Corvo.


Afinal, o seu martelo nunca foi esquecido.


Ela iria encontrar o maldito, e muitos recearam que os desejos da Tinkatuff se tornassem uma obsessão.


O casal de cetáceos principal do vale, Wohali e sua esposa, também foram abençoados com um novo filhote. Nada melhor que expandir a família em tempos de paz. Proteger o ovo diariamente passou a ser uma das novas tarefas favoritas da Tinkatuff, enquanto os adultos aproveitavam o clima de tranquilidade, apesar de que tamanha proteção vinda da fada era vista como um exagero por parte dos restantes.


Dia e noite a fada mantinha-se vigilante. Por vezes, mal dormia.


Era o mínimo que ela podia fazer para pagar a Wohali e sua família tudo o que eles fizeram por ela na infância. Todo o carinho, proteção, alimento, treino, histórias e amor. E qualquer cria nova não precisava de crescer com medo tal como ela e tantos outros ali. Assegurava-se que teria os primeiros dias de vida bem, pacíficos. Os melhores que uma criança pudesse imaginar.


– Gordinha, não precisas de ficar acordada o dia todo. – Wohali repreendeu-a. – Não vai acontecer nada.


A Tinkatuff encolheu os ombros. Gordinha passou a ser o nome pelo qual todos a tratavam. Até que achava adequado, já que ela não tinha nome próprio.


– O Corvo pode voltar a qualquer instante! – Ela resmungou entredentes. – Alguém tem que ficar de vigia, só porque ele não aparece há anos não significa que não se lembre de dizer um olá daqui a uma semana, ou, quem sabe, mesmo ainda hoje.


O Cetitan calou-se, pensativo, e deixou a fada nos seus devaneios.


Apesar da ansiedade em conhecerem o novo membro da família, o dia da eclosão do ovo não fora exatamente um momento feliz.


Estava tudo pronto na família para a chegada do pequeno Cetoddle. Os filhotes mais velhos, davam pulos de entusiasmo em redor do irmãozinho, e aqueles que já atingiram a maioridade e independência aguardavam, pacientes, com um esbelto sorriso manchado no rosto. O ovo brilhou, tomando uma nova forma, explodindo em brilho. As cascas do ovo voaram uns centímetros, dando lugar a uma criaturinha rechonchuda de pele negra.


Esperem…


Pele… negra?


O casal se abraçou, mas logo se largaram quando o pequeno bebé abriu os olhos no meio das cascas quebradas.


O pequenino Cetoddle olhou ao redor, sem compreender os motivos dele ser tão o centro das atenções. A mãe o tomou nos braços, apesar de um ligeiro medo provocar-lhe um formigueiro nas barbatanas.


Por fim, alguém quebrou o gelo entre o povo que assistia.


– Ele tem uma coloração diferente! – Balbuciou. – Isto não é bom…


– É um Pokémon Shiny… – Wohali murmurou, sentindo uma vaga de ansiedade em cima de si.


– O que tem o meu irmãozinho? Ele é doente? – A Tinkatuff questionou-lhe.


– Não. Nada disso… Ele só é… Diferente…


Depois das expressões de surpresa, vieram as de tristeza. Wohali não aguentou muito tempo com o bebé nos braços, entregou-lhe à esposa e abandonou o local. Apenas assim. Muitos outros Pokémon fizeram o mesmo, e, num piscar de olhos, só ficou a Tinkatuff e a Cetitan fêmea presentes nos espaço, sem nenhum dos outros habitantes do vale voltarem ali assim tão cedo para visitas.


O entusiasmo todo apenas tinha… Desvanecido. Como se agora o pequeno Cetoddle não tivesse mais importância.


– O que… O que é que aconteceu? – A Tinkatuff não compreendia nada.


Tudo se passara muito rápido, como os flashes de tempestades de raios em seus olhos.


A fêmea sentou-se ao lado dela, amamentando o seu bebé.


– Gostas de histórias, miúda? – Questionou-lhe de súbito.


– Sim. – Ela abanou a cabeça. – O Senhor Wohali costumava contar-me muitas histórias nas pausas dos nossos treinos, quando eu era miúda.


Ela assentiu.


– Achas que ainda aguentarias ouvir mais uma história? Desta feita, vinda de mim? Eu não sou lá muito boa a contar histórias, mas já és da nossa família. Chegou a hora. Tem uma coisa importante, que eu acho que precisas de saber.


– Claro. Histórias são imortais e imateriais. Elas carregam ensinamentos que podem auxiliar e ensinar pessoas de qualquer idade. – A fada respondeu, tentando perceber a onde a amiga queria chegar.


– Muito bem. – A mãe embalou a cria recém-nascida, com tanta serenidade, ao ponto do pequenito adormecer. Depois, murmurou. – Vamos começar então.

 

Há muito tempo atrás, um treinador humano de Zapapico adorava vir treinar seus Pokémon nestas montanhas. Porém, esse treinador tinha um método curioso de treino. Se algum Pokémon perdesse uma batalha, ele o descartaria, e capturaria um novo.


Certo dia, depois de perder uma batalha com outro treinador, esse humano desprezível largou dois Pokémon no topo da montanha, e de seguida, desapareceu para sempre.


Um desses Pokémon… Era um Cetitan… E bem… O outro era… Um Corviknight…


O Corviknight não estava habituado ao clima frio de Glaseado, por isso, ele tinha muita dificuldade em adaptar-se em nome da sua sobrevivência. Não sabia onde encontrar comida, e sempre andava em rixas com os Pokémon locais. Graças a Arceus, seu amigo, o Cetitan, estava em seu habitat natural, e logo auxiliou-o e protegeu-o o máximo que conseguiu consoante seus instintos.


Ambos eram companheiros inseparáveis, enquanto recuperavam a perda que era a dor de serem abandonados pelo treinador.


Porém, eles não ficariam para sempre assim juntos e unidos, pois nada é eterno.


Numa tarde fria, quando exploravam a montanha para encontrar abrigo face a uma tempestade que se avizinhava, encontraram um vale, que era governado por uma colónia de Cetitan. O Corviknight não quis continuar a caminhada, pois sentia que não seria bem-vindo lá em baixo, já que os Cetitan eram um povo bem territorial, o que podia entrar em conflito com sua natureza.


Mas seu amigo Cetitan ficou maravilhado por, depois de tantos anos, reencontrar Pokémon da sua própria espécie, e desejou conviver com eles. Enquanto isso, o Corviknight apoiou as escolhas do amigo a cada segundo.


Pela primeira vez em muito tempo, o Corviknight ficou sozinho e enfrentou os perigos da natureza da montanha sozinho. Viu-o descer até o vale e desaparecer, e no topo da montanha, aguardou o retorno do seu amigo.


Aquilo que julgou ser uma simples visita passageira ao início, tornou-se em visitas frequentes, e quase todos os dias, o corvo negro ficava à espera dele, enquanto o cetáceo descia sempre até a comunidade que lhe passou a ser muito amada.


O Cetitan partia de manhã antes do sol nascer, e regressava sempre, muito feliz, ao anoitecer, e o Corviknight sorriu com ele, feliz por ele, mas no fundo, começou um certo tipo de remorso. O Corviknight sabia que, para breve, ficaria sozinho naquele mundo frio, enquanto o seu amigo ia ao vale e convivia com seus iguais.


Certa noite, o pior aconteceu: o Cetitan não regressou.


O Corviknight eriçou as penas, preocupado, mas não quis descer ao vale, e então, aguardou pela manhã.


Mas na manhã seguinte, também não havia qualquer sinal. Não existia qualquer vestígio do seu regresso.


E os dias, tornaram-se semanas.


As semanas, tornaram-se meses sufocantes de espera.


Cansado de esperar, e faminto por não se acostumar ao clima de Glaseado e não encontrar alimento suficiente sem qualquer ajuda, o Corviknight soltou um piar de fúria. Elevou as asas e mergulhou colina abaixo, cortando o ar gélido, em direção ao vale.


A primeira coisa que a colónia de Cetitans sentiu foi uma ventania como a de um vendaval. Eles correram em direção ao corvo para expulsarem a ameaça do seu território, e o corvo, completamente alterado, atacou-os sem piedade, em busca do amigo, pois aqueles malditos tiraram dele quem lhe era mais especial. As perdas foram imensas, pois o poder do Corviknight se sobrepunha a qualquer poder dos outros.


Quando, por fim, encontrou o Cetitan, no centro de uma gruta gélida, seu olhar encarnado mostrou confusão, que logo tornou-se em revolta e fúria após contemplar a visão. O cetáceo estava ao lado de uma fêmea, e ambos tinham uma pequena cria nos braços. A cria era um pequeno Cetoddle, de cor diferente.


Muitos Pokémon rejeitam os Shinies pois acreditam que eles são um mau presságio. Talvez, os Cetitan daquele vale ainda hoje pensam nisso devido ao que aconteceu logo a seguir ao nascimento daquele Cetoddle. Aquele pequeno nasceu, e o desastre caiu dos céus em forma de massacre.


As penas do corvo negro eriçaram-se. Suas pisadas fizeram tremer a terra, enquanto se aproximava e fitava mais de perto toda a cena.


– Porque não me contaste que tinhas uma família aqui! Eu cansei-me de esperar por ti! – Gritou o corvo, em fúria. – Esqueceste de mim! Deixaste-me à fome!


– Amigo… Eu… Eu posso explicar… – O Cetitan começou, cheio de confusão. Ele próprio não sabia o que dizer.


Talvez, no fundo, o Corviknight tinha um pouco de razão quanto a isso. Ele o abandonara sem dizer nada. Apenas virara as costas a seu passado e tentara construir uma vida ali, sem dar resolução às pontas soltas. E o passado regressou para o atormentar, cedo demais.


– Abandonaste-me, tal como o nosso treinador! – O corvo piou mais alto, mas tão alto, de tal maneira que as estalactites que pendiam no teto da gruta quebraram e caíram tamanho fora a vibração do eco do som.


O casal desesperou em se proteger, mas tudo o que fizeram foi em vão face à queda repentina das farpas do teto. E uma delas atingiu em cheio, a cria recém-nascida… Bem em cheio, no coração.


– O quê… O que é que fizeste? – O Cetitan gritou, com a cria imóvel nos braços, enquanto a fêmea chorava aos prantos, e a tentava reanimar.


O desespero caiu naquela terra, naqueles segundos, era claro no jovem casal.


Mas o olhar do Corvo não demonstrava qualquer nível de arrependimento, e muito menos, de perdão. Pelo contrário, sentiu prazer naquilo.


Ao se aperceber que sua cria não voltaria à vida, e ao notar todas as mortes que existiam lá fora, o Cetitan atirou-se ao Corvo.


Ambos lutavam de igual para igual. Mas a fúria da ave era maior que a dor da perda da criança, e o Cetitan vacilou, depois de horas e mais horas que ambos trocaram golpes que fizeram a montanha tremer.


O cetáceo recuou alguns passos. Perdera um chifre, e parte do corpo estava desfigurada devido às garras do grande maldito corvo. O Corviknight também ganhara umas boas cicatrizes, mas estava mais revigorado do que nunca, como se toda a batalha o tivesse enriquecido em vez de enfraquecido.


Ambos ofegavam.


O Corviknight podia ter acabado com ele naquela altura com um golpe certeiro na nuca do Cetitan. Mas apenas não o fizera. Queria ver o seu ex melhor amigo sofrer, igual àqueles meses todos que ele esteve sozinho no ponto mais alto de Paldea, a tentar sobreviver no meio da neve e gelo.


Querem brincar às casinhas? – O Corviknight gargalhou, com o corpo da cria entre as suas garras enormes. Apertou tanto o corpo arredondado do pequeno que o mesmo explodiu em pedaços. – Então vamos brincar.


Ele foi ao exterior e dirigiu-se no meio da multidão, o grupo de Cetitan rugiam e outros ainda lamentavam as perdas dos familiares e auxiliavam os feridos. Foi quando o Corvo atirou o corpo desfigurado da criança para o centro do vale, e com o peito estufado, bramiu aos céus.


– A partir de hoje, vocês serão os meus bichinhos de estimação. E eu serei o vosso treinador! – Anunciou ele, com uma gargalhada histérica, que nunca mais seria esquecida entre os presentes.


Ergueu as asas e voltou ao ponto mais alto de Glaseado. Reuniu os Pokémon mais perversos que habitavam em suas sombras, em troca de poder e recompensas, enquanto os Pokémon do vale lamentavam toda a tragédia. Com medo do Corvo regressar, e voltar a desvanecer sobre eles a sua fúria, começaram todos a lhe prestar culto e a lhe oferecerem alimento e proteção. E quem se rebeliava face a suas ordens, mais tarde ou mais cedo, sofria terríveis consequências.


Era apenas o início do seu reinado de terror sob a montanha.

 

As palavras da mãe Cetitan cederam. A Tinkatuff moveu-se, como se estivesse a despertar de um sonho que tivera enquanto acordada. Até aquele momento, não tinha pestanejado. As sombras de ambas tremeluziam, sinistras, nas paredes da gruta, em contraste com a luz existente lá fora.


– Isso… explica muita coisa. – Começou a dizer, procurando as palavras certas. – Sempre me questionei dos motivos de Wohali saber tanta coisa sobre os humanos. E já estava óbvio que ele tinha um passado com o Corvo.


– Brites era o nome dela… da minha menina… – A mãe começou a chorar, fitando a sua nova criança adormecida em seus braços, e beijando-lhe a testa. – Ele não é ela… Mas o mesmo peso… A mesma cor rara… Lembrou-me todos os dias daquele massacre, como se fosse ontem.


– Eu vou encontrar o Corvo. Não era motivo para tudo o que ele fez. Ele merece a morte depois de tudo isto… – A Tinkatuff cerrou o punho, com o coração carregado de revolta. – Mas mesmo assim, porque é que o Senhor Wohali não foi sincero com ele? Isso podia ter evitado tanta coisa, certo?...


A mãe Cetitan continuou com os olhos perdidos nas lágrimas. Sua mente procurou as palavras certas no meio da mágoa e da dor.


– O corvo era ciumento. O Wohali disse-me que apenas não sabia como lhe contar. Ele aguardou até se sentir pronto a isso, mas a hora nunca chegou e foi tarde de mais. Não gosto de lhe pressionar, e ele não menciona o assunto. Acredito que tenha algo mais nessa história, sinto que ele não foi sincero comigo a cem por certo quanto ao assunto. Acho que em certo ponto, ele esqueceu-se a sério que o seu melhor amigo esperava por ele e sentiu-se culpado.


– Isso é horrível… – A Tinkatuff acabou por soltar, incrédula.


– De certa maneira, também me sinto responsável. Fui eu que implorei ao Wohali para passar as noites comigo na época… Éramos um casal jovem, maluco, apaixonado, mas eu não sabia sobre o amigo dele… e por outro lado, não tenho arrependimentos. Foi a nossa escolha, e com ela, criamos uma família e vivemos uma vida maravilhosa…


Fez-se um breve minuto de silêncio.


– Acredito que o Senhor Wohali não vai descansar enquanto a situação do Corvo não for resolvida. – A Tinkatuff suspirou, algum tempo depois.


Ela segurou a barbatana da amiga, de forma bem firme.


– Eu prometo. Vou encontrá-lo e dar um final a esta história toda uma vez por todas. Assim, posso recuperar meu martelo, e vocês, viver em paz graças à justiça… Numa paz verdadeira e palpável.


– Não… Não sei… Esta criança foi um sinal e…


– Se tem uma coisa que as histórias do Wohali me ensinaram é que não podemos julgar um povo inteiro por um individuo só. – A fada declarou, lembrando-se do final da história da Lechonk caída do céu que Wohali lhe contara, tantos Verões atrás, enquanto fitava o pequeno Cetoddle com ternura. A Cetitan ficou em silêncio. – A situação com a vossa primeira cria não correu certo, mas não significa que, com este pequeno, a mesma história se repita.


...


Na manhã que se seguiu à história reveladora, a Tinkatuff decidiu reunir algumas berries, agarrar sua pá, e partir viagem. Não disse nada a ninguém, pois sabia que, se comentasse alguma coisa, levaria sermão. Além disso, não planeava ir muito longe… Pelo menos, para já.


A sua primeira paragem seria o pico mais alto de Paldea. O lar do Corvo. O local onde, de acordo com a história, o treinador humano os havia abandonado aos dois.


Subir a montanha até ali não era difícil, e ficaria próxima do vale o suficiente, caso alguma coisa, ou alguém, lhe atacasse, e ela sentisse a necessidade de pedir e gritar por ajuda.


E ela tinha que começar a caçar o Corvo em algum lugar. Nada melhor que explorar um pouco o próprio ninho onde aquela besta sempre se empoleirava durante o seu reinado de terror.


Sentiu algo sinistro com o facto de nenhum Pokémon querer se aproximar do espaço… Ela não os julgava, afinal, o local e o pequeno altar onde os alimentos oferecidos ao Corvo eram depositados, davam-lhe calafrios, como se o espaço inteiro fosse constantemente assombrado por más energias. Remexeu-se, nervosa, sempre com o punho bem serrado no cabo de madeira polida da sua pá valiosa. A energia negativa que pairava o ar era quase palpável, como uma fera viva espreitando em todas as sombras.


Ninguém ousava aproximar-se da placa de madeira ali instalada pelas mãos humanas, tirando, talvez, um ou dois Gimmighoul que gostavam de apreciar as vistas e roubar as carteiras dos poucos humanos que por ali se aventuravam, já que, para eles, era um ponto turístico famoso.


A Tinkatuff deu uns passos em frente, contornando o altar. O espaço entre a rochas encontrava-se vazio. Não passava de um pilar encoberto de neve, uma simplória lembrança de outros tempos. Ela recordou-se da primeira vez que ali estivera, da voz do Corvo, tremendo a terra e o ar, da discussão e da luta sangrenta que sucedeu-se após isso, e da má qualidade dos alimentos que Wohali tinha direito. Dos dias a fio que as crias e as famílias do vale passavam fome.


Agarrou a sua pá com ainda mais firmeza, reunindo toda a sua fúria e frustração.


Aterrou a mesma no pilar.


Ele já não precisava de existir. Só trazia memórias ruins.


As rochas se desfizeram devido à ferocidade do seu golpe. Alguns dos pedregulhos voaram, em diferentes direções. Um deles foi até a placa de madeira, batendo nas letras lá gravadas pelas mãos humanas. Quando a rocha desceu na neve, a Tinkatuff notou um ‘’ping’’ característico de… metal?


A fada olhou, totalmente desperta, procurando a origem do som. Seu instinto de apreciadora daquele material nunca se enganava quando estava perto de alguma peça que pudesse moldar a seu prazer.


Aproximou-se, ultrapassando os limites, pisando neve que ninguém ousava nunca pisar.


Passou seus dedos grossos pela placa, sentindo-lhe a textura. Inúmeros traços eram recortados ao longo da madeira. Eram letras, que diziam algo como ‘’O Ponto mais Alto de Paldea, uma das dez maravilhas da região’’ mas a Pokémon não sabia isso, pois nunca convivera com humanos o bastante para reconhecer aqueles símbolos bizarros que agora preenchiam a sua imaginação.


Mas apesar do seu conhecimento limitado, sabia que uns três furos encontrados ao longo da placa não lhe eram saliências naturais. Alguma coisa cintilava no fundo do abismo negro de cada um desses buracos.


Esfuracou a madeira, abrindo-a mais, e removendo com cautela uma espécie de cilindro comprido de metal.


Fez o mesmo com os restantes dois buracos. Precisou de um pouco de força e agilidade a manobrar seus dedos gordos para conseguir remover aquilo da placa, mas com calma, lá conseguiu.


As três peças minúsculas de metal tinham um tom prateado, e, numa das extremidades, era mais comprida e afiada que a outra.


Com ar confuso, ficou a fitar aquelas três peças na palma da sua mão, pois nunca antes vira nada daquilo. Olhou ao redor, pensando em o que fazer a seguir.


Depois olhou para baixo.


Algo lhe disse para… apenas, olhar para baixo.


Várias rochas estavam ali amontoadas, parcialmente encobertas de neve e galhos soltos de algum arbusto rasteiro, já sem folhas. Alguns daqueles rochedos serviam para sustentar a placa de madeira no ar, mas a Tinkatuff sentiu que, ali, bem no meio, estava escondido algo… Algo mais.


 Uma das rochas reluzia à luz fraca do sol, e lembrava mais um pedaço enorme de metal que outra coisa, já há muito enterrada na neve. E, de facto, o era. O barulho que ouvira quando a rocha do altar caíra ali, fora, possivelmente, causada pelo impacto que tivera naquela peça há muito perdida.


Segurou na sua pá e penetrou-a ao lado daquela peça de metal, bem a fundo.


Expirou e inspirou.


Expirou e inspirou.


Preparou-se, e fez força com a pá, cavando o gelo.


Tentou aguentar o peso que a revelação teria, para não gritar em choque.


Penas negras, pele, placas de metal do que outrora fora uma armadura, e ossos, ergueram-se ao ar com o movimento proferido pelo seu longo instrumento de batalha. Um grito silencioso formava-se num grande bico aberto, ainda preso num crânio, que surgiu quando o gelo que o encobria deslizou ao chão. As asas, outrora, sempre eretas, viradas aos céus, encobrindo o sol, agora pendiam, inertes.


Devido ao frio, a maior parte do corpo ainda se encontrava bem conservada.


A figura do Corvo era irreconhecível, e, ao mesmo tempo, um terror familiar.


A Tinkatuff deixou a sua pá cair como reação à descoberta. Permaneceu, imóvel, observando aquela criatura toda retorcida. A armadura que cobria o peito do Corviknight contava com vários furos, semelhantes ao que a Tinkatuff avistara na placa de madeira.


O que quer que tivesse acabado com o Corvo, ia muito além da sua compreensão.


Arrancou o metal do corpo da ave morta para o moldar e o usar a seu bel-prazer. Continuou à procura de mais provas que pudessem levar à origem de tudo aquilo, mas não encontrou mais nada de suspeito.


Tinha o metal do seu precioso martelo de volta. Sua vingança estava, tecnicamente, concluída. Mas porque é que aquilo tudo tanto a inquietava? Jurava que iria ser inundada por uma onda de paz e felicidade quando tivesse o seu martelo em mãos, mas não fora isso que acontecera.


Muito pelo contrário, o incómodo dos tempos calmos tornou-se ainda maior.


Talvez, tal má sensação na boca era derivada do facto de não ter sido ela a o enfrentar e a o matar? Ela não sabia, mas tinha a certeza, que tinha que resolver aquilo.


O Corvo fora derrubado.


O Corvo estava morto.


Mas, como ela previa… E como a superstição dos Cetitan face a Pokémon de coloração diferente ditavam…


Um mal novo espreitava a montanha.



A descida até o vale fora mais pesada do que o costume.


A primeira coisa que tinha que ser feita era dirigir-se até a gruta do casal e informar Wohali da macabra descoberta. Ao mesmo tempo, ela não queria anunciar a toda a gente a existência do corpo, pois sabia que o seu velho amigo Cetitan precisava do momento de luto e reflexão só para si devido a seu passado. Por hora, limitou-se a lhe dizer que tinham que lhe mostrar qualquer coisa no topo da montanha.


Partiram mesmo no final daquela noite, chegando ao destino logo de manhãzinha, pouco antes do sol nascer. Toda a viagem foi silenciosa, como se Wohali já desconfiasse o que a Tinkatuff tinha para lhe contar.


Ao chegarem ao topo, não demoraram muito a analisar o corpo. O céu clareou com o nascimento do sol, deixando toda a paisagem ainda mais clara e solene. A fada já havia retirado metade da armadura e expandido a sua pá. O Cetitan auxiliou-a a retirar o que restava de metal que podia ser aproveitado. Os restos mortais do Corvo foram enterrados no local onde outrora existia o altar, com as pedras do mesmo encobrindo o espaço.


Os trabalhos foram feitos sem troca de palavras.


Cada pedra fora posicionada de forma estratégica, lembrando o velho altar que a Tinkatuff destruíra, logo, quem por ali passasse não desconfiaria de nada. Era como se o pilar de rochas nunca tivesse saído daquele espaço, abrigando a ossada de uma ave negra perversa.


A fadinha desejou protestar. O Corviknight não merecia aquele espaço de descanso tão digno. Por ela, ela atirava a ossada do maldito corvo para algum local distante. Talvez, desse de alimento a alguma matilha faminta de Lycanroc. Ou atirasse-o bem no fundo da Grande Cratera de Paldea, para as feras que lá habitavam deliciarem-se com os restos. Reduzir aquele corpo a pó era uma certeza sua.


Mas nada disse, respeitou os desejos do velho cetáceo.


– Espero que a natureza da montanha te tenha alinhado os pensamentos, amigo. – O Cetitan começou a dizer. – Quando Arceus me levar a seu reinado, espero que possamos fazer as pazes e falar sobre arrependimentos… Isto, caso as portas de Giratina sejam abertas para permitir nosso reencontro.


A fada torceu um pouco o nariz. Se achava o ‘’belo altar’’ uma porcaria para abrigar o corpo daquele maldito, então aquela prece era dispensável. Enquanto Wohali estava de costas viradas para ela, ainda a fitar a paisagem e a refletir sobre a finalidade de tudo aquilo, ela encarava os pedacinhos prateados que tinha na palma da mão.


Não dissera nada a seu companheiro sobre aqueles estranhos cilindros. Preferiu esconder os mesmos do olhar sábio dele.


Ele julgava que a morte do Corvo não passava de causas naturais. Fizera um frio excepcional naquele dia a seguir ao ataque da alcateia. Talvez, a ave negra não aguentara a pressão, e a neve cobrira o corpo caído muito antes de alguém reparar nele.


Era melhor assim.


Tudo estava terminado.


A Tinkatuff não queria que o Cetoddle recém-nascido arcasse outra preocupação. Não queria que o vale e seus habitantes vivessem, mais uma vez, a pressão que era saberem que existia um predador à espreita.


Apertou o punho, escondeu aqueles pedaços misteriosos e olhou em frente. Uma suave brisa de vento moveu-lhe os cabelos desgrenhados. Sentiu um peso por esconder a real causa de morte do Cetitan, mas era o mais indicado no meio de tantas circunstâncias.


– Sei no que estás a pensar… – Ouviu a voz do amigo, de súbito. Ele se aproximava dela. – Que o teu trabalho aqui está feito… não é?...


– Toda a minha vida eu ansiava recuperar meu martelo e derrubar o Corviknight que mo roubou. – Disse, fitando a sua pá e a nova camada de metal que a revestia e mais pesada a deixava. – Mas, ainda não me sinto completa.


Ele assentiu.


– Sabes… Em tempos senti essa mesma sensação. Acho que nunca pensaste bem no que viria a seguir, estou correto?


– Sim. – Ela não o podia negar. Mas ao mesmo tempo, procurou as palavras certas, para não revelar seus planos. – Acho que preciso de um novo objetivo para me guiar na vida.


Wohali esboçou um sorriso. Um lento e triste sorriso.


– Então… Era assim que ali o velho corvo se iria sentir se eu lhe tivesse contado… – Murmurou para si. – Minha gordinha. Não te quero obrigar a nada. Se achas que deves partir… Apenas vai. Vai e encontra um novo lugar na natureza. Terás todo o meu apoio. Mas antes, quero que saibas que foste uma das melhores coisas que me aconteceu, e és como uma filha para mim. Uma bênção. E aqui, serás sempre bem-vinda.


A Tinkatuff deixou uma lágrima escapar. Virou-se, e sem hesitar, abraçou o velho cetáceo, com todas as suas forças. Ficaram tanto tempo assim que a pequena fada até sentiu em seu corpo a textura de todas as cicatrizes que o pintavam. Wohali também chorava, enquanto a apertava com força, como se desejasse pegar nela em suas barbatanas como uma minúscula berry. Ela já estava maior, muito maior, e dificilmente se iria voltar a confundir no meio de um montinho de bagas, mas, para ele, ela seria para sempre a sua pequenina.


– Obrigado. Muito obrigado Senhor Wohali. Muito obrigado por tudo.


Após um breve observar ao vale, que seria o seu último em muito tempo, começou a se distanciar. Levava consigo apenas a sua pá. Ela não precisava de mais nada depois daquele momento precioso de despedida.


 Já uns metros á frente, ouviu a voz do amigo a chamando. Quando olhou para trás, este acenava.


– O gordo de nosso vizinho desdentado foi visitar a família a um outro vale, ele já saiu há umas semanas com suas crias... Se o vires, chama-o de gordo!


– É claro! – A Tinkatuff começou a rir, retomando sua marcha. – E vou-me certificar que nós os dois iremos rebolar outra vez montanha a baixo!


– E boa sorte, minha gordinha! Que Arceus te guie na tua demanda!



Capítulo Adicional Continua Na

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