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- PARTE 6 – O Desconhecido – A Fada, o Corvo, e o Baleeiro
Um Sawsbuck de
pelagem de Inverno passou a sua frente numa correria. Era tão veloz cortando a
estrada que a Tinkatuff mal deu por ele em sua frente, quase sendo atropelada.
Estranhou o comportamento súbito do Pokémon, mas não fez muito caso. Avançou no
meio do trilho de terra batida. Até agora, a viagem corria calma, tranquila,
sem nada de suspeito.
Procurou o
Pokémon com olhar, encontrando-o, com as orelhas fitadas e o olhar atencioso,
uns metros abaixo, ainda a galope, mas já a reduzir velocidade até parar. O
peito dele subia e descia descompassadamente.
É… Talvez, o
melhor era mesmo perguntar se tinha ocorrido alguma coisa.
– Ei, amigo,
para quê tanta pressa? – Projetou sua voz até ele, metros abaixo. – Para a
próxima tem mais cuidado! Quase me ias botando ao chão.
– XIUU. Menos
barulho! – Ele rebateu, depois de procurar a direção de onde vinha a voz. –
Corre! Eles estão perto!
Eles?...
– Mas, quem
são eles? – A fada questionou,
perplexa com toda a pressa e sua pressão.
– Não sabes? –
O veado pareceu incrédulo, como se não acreditasse na ignorância da outra. –
Caçadores! Vários Pokémon de Glaseado já desapareceram por culpa deles!
–
Caçadores?... – Ela ficou confusa. Sentia sede por mais informações Seria algum
Pokémon predador novo? – Não consegues explicar melhor?
– Sem tempo,
não dá! FOGE! Foge se dás valor à tua vida!
E quando disse
‘’Foge se dás valor à tua vida!'‘ já
ele ia muito distante, tanto que sua súplica era um ofegante grito que ecoou na
encosta à medida que seus cascos pulavam de lugar em lugar.
Sentiu um
vento gélido ainda mais frio que o usual incidir-lhe nas costas. O que quer que
fosse que tivesse a perseguir aquele coitado, era, talvez, quem ela procurava.
Sem o rei da montanha a controlar tudo, apesar dos defeitos, óbvio que muita
coisa iria passar despercebida entre as comunidades dispersas. Nada melhor que
atacar quando todos menos esperam. A Tinkatuff acelerou o passo, sem saber se
devia correr para se proteger ou dar meia volta e cortar o mal pela raiz. O que
quer que fosse, já estava a caminhar na mesma estrada que ela percorria.
Foi ai que
avistou uma rocha grande, na beira da estrada.
Era o
esconderijo perfeito.
Foi até lá, e
aguardou.
Silêncio.
Vento.
O bater
descompassado do seu coração.
O peso da sua
arma em riste.
Mais vento.
Silêncio.
Dez minutos se
passaram.
Algo cortou o
silêncio.
Um som súbito,
sibilante. Tão súbito que a Tinkatuff não soube distinguir se era real ou
produto da sua imaginação.
Aguardou.
Esperava por mais. Precisava de uma confirmação, do que quer que aquilo fosse.
Mais silêncio.
Mais dez
minutos.
O barulho
ecoou outra vez na encosta.
Desta feita,
ainda mais perto.
Muito perto.
Queria
aguardar. Queria correr. Era um som semelhante ao embate na sua pá nas rochas.
Mas ainda mais aterrador que as explosões que as rochas proferiam com seus
golpes.
Sentiu o som
de cascos a passar numa galopada frenética.
O mesmo Sawsbuck
desesperado dera meia volta e estava, outra vez, no meio do trilho.
Outro barulho.
O som de algo
a cair, um baque abafado no solo.
A Tinkatuff
espreitou por cima da rocha.
O Sawsbuck
encontrava-se a alguns metros dali, esperneado no chão de pedra e cascalho. Ele
mal conseguia gritar, engasgado num líquido vermelho que só podia ser o próprio
sangue. Seus olhinhos negros estavam tão esbugalhados e brilhantes que quase
lhe saíam da órbita.
Deixando as
traseiras de uma moita, após o farfalhar de seus galhos, mesmo ali ao lado,
surgiram três figuras disformes. Ouviu vozes. Do outro lado, mais umas duas ou
três daquelas criaturas bizarras sem pelo e de roupas coloridas, apareceram
vindas de sabe-se lá de onde. Os bichos bípedes traziam umas ferramentas
bizarras em mãos. Um deles foi com a mão ao bolso, e, apesar do terror, a fada
conseguiu distinguir em seus dedos um dos tais chumbos que ela encontrara,
tanto na placa de madeira como na armadura do Corviknight.
Foram eles.
O humano
recarregou a espingarda.
Apontou a arma
na cabeça do jovem Sawsbuck.
Pressionou o
gatilho.
O som abafado
de antes, mais alto que nunca, ecoou pelo céu.
Em poucos
minutos, o veado imobilizou-se. Deixou de espernear.
Estava morto.
A fada evitou
gritar, mas um berro incontrolável de espanto e terror foi gravado em seus
lábios, agora encobertos pelas suas mãos trémulas que abafavam o som, em vão.
Pressionou a cara.
Não vou gritar mais. Não vou gritar mais.
Sou mais forte que isto para gritar.
O que é que
ela acabara de assistir?... Só esperava que o que quer que aquelas criaturas
eram, não a tivessem pressentido ali.
O Sawsbuck de
antes, a correr, cheio de energia, ainda era uma visão demasiado recente para
ela. Ela não queria acreditar que era o mesmo Sawsbuck que agora estava ali,
estirado no chão.
Morto.
Olhou para o
ponto mais alto de Glaseado. A montanha estendia-se quilómetros e mais
quilómetros ali ao lado, arranhando o céu. Estava longe do vale mas… Pensou nos
Cetitans e todos os Pokémon que lá conhecera. Desejou que eles tivessem seguros
ali naquele cantinho especial, com o seu rio serpenteando as águas límpidas
diariamente. Não suportava a ideia de ver Wohali sofrendo o mesmo tipo de
brutalidade que acabara de viver.
Tinha que
proteger sua família. Tinha que proteger seu velho lar.
Estava perdida
nos pensamentos, em choque.
Foi quando
sentiu alguém puxar-lhe a pá.
Caiu uns
metros em frente, com o empurrão súbito que levou.
Fora descoberta.
Mas estava com
demasiado medo daquele desconhecido atrás de si e de tudo o que ocorreu para se
mexer e se proteger nos segundos que se seguiram. Ainda demorou muito tempo,
mais do que conseguiu imaginar, a reagir.
Aquilo era
completamente fora do seu alcance.
Pessoal. Olhem! Aqui! O que eu encontrei!
– Aquela coisa gritou aos outros, mostrando seus dentes amarelos e retorcidos.
Outro daqueles
seres aproximou-se.
A menininha tá perdida? – Ele gargalhou,
pontapeando-lhe o braço.
O canudo da
espingarda estava prestes a soltar outro dispare. A fada sentiu o canudo frio
penetrar-lhe o cabelo.
O que tu tá fazendo, mano? – Um deles
repreendeu-o. A Tinkatuff teve o leve vislumbre de ver o humano baixar a arma.
– Ela é minha. Depois vou ver o que fazer
com ela.
Para que queres esse Pokémon?
Ela parece forte. Bem forte.
Ela é gordinha. É bem mais proveitoso se ela
fosse a derreter como os outros.
Ela estancou… Derreter
como os outros?... Como assim, derreter? Não entendia muito bem a voz dos
humanos, mas por algum motivo, graças a alguma força misteriosa, algum chamado
do destino, conseguiu distinguir aquela frase, bem nítida, em sua cabeça.
Despertou para
a realidade.
Tinha que
lutar. Que fugir. Tal como o veado a instruíra.
Foge se dás valor à tua vida! – A voz do
pobre coitado ecoou em sua mente.
Deu um pulo
súbito.
Ela não queria
limitar-se a fugir. Ela queria lutar em nome de quem amava. Queria acabar com
aquela praga e salvar sua família. Libertar seu lar de tamanho mal. Soltar a
montanha do novo horror que a encobria.
Fez a sua pá
girar, derrubando no chão os humanos desprezíveis que a rodeavam. Ouviu a
espingarda disparar, quando quem a portava caiu ao chão, mas não notou para
onde o tiro fora. Fez a pá deslizar outra vez, cravando-a num dos crânios do
inimigo. Ouviu-se outro disparo. Uma dor percorreu-lhe o cotovelo. Uma dor
imensa. Largou a sua pá, para analisar seu próprio braço. Sangue escorria. Ela
nunca imaginou que ficaria tão tonta por ver a sua própria ferida escorrendo de
tamanha maneira.
Depois, sentiu
outra pancada. Outro disparo.
Tudo, foi tudo
muito rápido.
Tudo se
apagou, antes de ter a sensação de que estava a ser sugada por um raio para o
interior de qualquer coisa húmida e quente.